Na semana em que se comemora o Dia Mundial do Livro (23), a reportagem do Dia a Dia News conversou com Felipe Lisonjeado, o “nordestino que tem como ofício contar histórias”, como ele mesmo se descreve. Formado em Letras Vernáculas pela Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Felipe é professor da área de Linguagens e mestrando em Educação pela mesma instituição.
Ao Dia a Dia News, ele narrou o seu enredo como um apaixonado pelos livros e pelo seu poder transformador de realidades. Felipe, com muita convicção e orgulho das letras que escrevem sua trajetória de vida enquanto contador, descreveu como a contação de histórias adentrou a sua vida acadêmica e também laboral.
Desde criança, o Letrólogo tinha o desejo de ser artista, mas por dificuldades financeiras não pôde cursar teatro. Quando ingressou na UEFS, ele teve a oportunidade de cursar uma disciplina que lhe trouxe conhecimentos teatrais e lhe apresentou a contação de histórias.
“Ouvindo colegas de graduação falando sobre a oferta duma disciplina voltada a contação de histórias- que parecia ser de teatro, parecia ser coisa de artista- eu me interessei, mas não tinha mais vaga. Contando as minhas lamentações num determinado setor da universidade, a professora da disciplina me ouviu e me deu a oportunidade de atuar como seu monitor durante as aulas e assim eu seria também aluno”, narrou Felipe.
Ser aluno e atuar na monitoria da disciplina Conta comigo “foi um marco fundamental para eu me entender como artista, como contador de histórias. Para além disso, eu percebi a possibilidade de ser um professor que conta histórias; um diferencial para o meu currículo”.
Felipe Lisonjeado destacou que, para além das aulas da disciplina, a sua participação em feiras literárias provocou ainda mais encantamento e certeza para sua atuação como contador. Inclusive foi numa edição da Feira Literária Internacional do Pelourinho que ele descobriu a sua história fundante- aquela história impulsionadora do desejo de ser um contador- ” O farol”, contada por Mabel Veloso.

O professor ressaltou a sua atuação no Observatório de Contação de Histórias, projeto de extensão da universidade, e também a criação, junto a sua irmã, Cíntia Maria, que é professora de Matemática-” disciplina bem distante da Literatura”- e Léo Sátiro, do grupo Pipas Liter’Arts; esse último voltado para a contação de contos sertanejos.
Para escolher as histórias, Lisonjeado afirmou que precisa se sentir tocado, precisa ter conexão com o enredo, mas ressaltou ” a depender do mote- eixo temático estudado / eleito pelo grupo ou pela empresa contratante do serviço de contação- eu conto a história eleita e não a que me pegou”. Todavia, além das histórias escritas, “muitas das histórias que eu escuto, eu conto” , disse Lisonjeado ressaltando a importância de o contador de histórias ser um ” bom escutador”, haja vista a importância da valorização e manutenção das histórias orais contadas pelos mestres, pelos mais velhos.
O tripé do contador é o corpo, a voz e o olhar. Esse último elemento é a principal técnica utilizada por Felipe ao contar histórias, a fim de aproximar o seu público durante a contação; ele também dialoga com o seu espectador fazendo-o se sentir dentro da história, “autor” do enredo.
Reflexão para os ouvintes, formação leitora ( literária e leitura de mundo) e movimento terapêutico para o contador: esses são os principais objetivos de Felipe ao contar histórias. Ressaltando o primeiro objetivo, ele narrou o episódio dum garoto vítima de bullyng que percebeu a necessidade de ler a historia que ouvia para os seus colegas, a fim de lhes gerar reflexão e cessamento das agressões feitas por eles. Dessa maneira, o professor destacou o poder transformador de realidades que as histórias, os livros têm.

Sobre o movimento terapêutico da contação, Lisonjeado afirmou possuir diversas experiências comprovadoras desse poder e narrou, pela primeira, a vivida no ano de 2022 na FLIFS ( Festival Literário e Cultural de Feira de Santana). Junto aos outros dois integrantes do Pipas, convidados para apresentar Cantos do Sertão, Felipe Lisonjeado sentiu-se profundamente representado no personagem que dava voz, o pássaro Assum Preto, um dos presentes no enredo baseado em canções de Luis Gonzaga.
“Enquanto eu contava a história, cantava a música e via as pessoas ali, eu me emocionei, porque eu me conectei com o Assum Preto. Com a licença poética que conseguimos, a história do Assum se tornou de libertação, então eu comunguei com ela, pois me recordei da minha trajetória, [porque] eu também estava preso: tempos antes eu havia sido diagnosticado com depressão e transtorno de ansiedade devido ao trabalho no telemarketing, e me libertei através das histórias, dos livros”.
A FLIFS, realizada pelo Sesc- onde a entrevista aconteceu graças ao apoio à cultura, educação e arte por parte da instituição- em conjunto com a UEFS, é um evento onde muitas contações e histórias orais são eternizadas em memórias e corações. Enaltecendo o seu ofício, Felipe Lisonjeado fez questão de destacar ” a contação de histórias é para todos aqueles que têm coração e ouvidos abertos”, finalizando o contar da sua história, até então, para o Dia a Dia News.
Fonte, escrita e fotos: estagiária Letícia Linhares